Agora, não dá mais para fazerum "acordão" e terminar tudo em pizza


Com a descoberta de que o esquema chamado pela imprensa de “lavanderia do Marcos Valério” tinha sido usado também na campanha eleitoral do ex-governador e hoje senador mineiro Eduardo Azeredo, presidente do PSDB, começou a ser disseminada, na semana que passou, a impressão de que a crise política havia atingido o seu ápice e, a partir daí, começaria a refluir, sinalizando para um acordo que levaria à não punição dos culpados. Uma análise um pouco mais cuidadosa e menos apressada leva a conclusões opostas.
“Há uma percepção generalizada de que o pior da crise já passou, mas ainda é cedo para isso. Há toneladas de documentos sendo analisados e muita coisa ainda pode surgir até a terrível definição de quantos, quais e quando devem ser cassados no Congresso.”
Eliane Catanhêde, Folha de S. Paulo, 31.07.05
Nem a entrada em cena do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Nelson Jobim, advertindo para a necessidade de moderação e de preservação do presidente da República, nem mesmo um início de conversações entre o PTB e o PL, com a chancela do presidente da Câmara Severino Cavalcanti, para evitar a cassação de algumas cabeças coroadas diretamente envolvidas no escândalo, são suficientes para iniciar a elaboração de uma grande pizza.
“A garrafa da crise está dessarolhada e não é mais possível voltar a fechá-la. A pressão criada no interior da garrafa pela fermentação da ganância, rivalidades, inveja de classe, fome de poder, ódio, culpa e pânico parece destinada a expelir tudo o que existe dentro dela, até a última gota.”
Tales Alvarenga, revista Veja, 03.08.05
O máximo que se pode conseguir nas circunstâncias atuais é um acordo que permita uma “blindagem” possível para o presidente Lula. Mesmo assim, sob a condição de não aparecer nenhuma prova cabal do envolvimento pessoal do presidente ou de seus familiares.
Num caso assim, nem mesmo a melhor das boas vontades políticas compartilhadas poderia impedir o agravamento extremo da crise e a abertura de processo parlamentar de crime de responsabilidade contra o presidente, mesmo com o Congresso desmoralizado como está. Claro que, nesse caso, o cenário seria de ebulição total. “Nitroglicerina pura”, como disse certa vez o ex-presidente Collor, de triste memória.
“Não me sinto em condições de prever até onde isso vai chegar. Tudo depende dos desdobramentos. Quem achar que tem claro o que vai acontecer é porque não está entendendo nada.”
José Serra, prefeito de São Paulo, FSP, 31.07.05
É completamente despropositado imaginar que a atual crise política, considerada, segundo nota oficial do PPS, divulgada em 31.07.2005 e assinada pelo presidente do partido deputado Roberto Freire, “a mais grave da história republicana”, possa se resolver com uma grande pizza que seja colocada no forno para festejar a costura de:
“… uma espécie de anistia geral que permitirá que se safem alegremente da confusão tanto os agraciados com o mensalão quanto os beneficiados pelo caixa dois.”
Otávio Cabral e Thaís Oyama, Veja, 03.08.05
Do ponto de vista político, o país caminha pelo fio da navalha e um escorregão pode provocar conseqüências sérias, inclusive do ponto de vista da economia que, em caso de desarranjo, será inevitavelmente contaminada. Espera-se dos mais responsáveis juízo, inclusive e sobretudo do presidente da República. Dos irresponsáveis, pode-se esperar qualquer coisa, inclusive renúncias em série de mandatos parlamentares.