Japão, eleição e serenidade

No final de 97, depois do abalo provocado pelo pico da crise asiática no final de outubro, já era possível vislumbrar o ano de 98 como o mais incerto da era do Real. A conjuntura internacional continuaria instável, as medidas tomadas pelo governo para enfrentar o furacão asiático repercutiriam perigosamente nas finanças públicas e a eleição lançaria combustível nesses e em outros focos de incêndio.
O virtual empate técnico entre as recandidaturas de Fernando Henrique Cardoso e Lula, detectado nas pesquisas recentes (inclusive no 2º turno), terminou por materializar essa incerteza antevista.
Da Ásia, os eventos mais recentes só fazem reforçar os temores. O Japão, segunda economia do mundo, anuncia sua primeira recessão (tecnicamente caracterizada por dois semestres consecutivos de crescimento negativo do PIB), desde a crise de petróleo em 1975. Responsável pelo consumo de 60% da produção asiática, o Japão em recessão coloca as economias dos Tigres em situação pior do que já está, ameaçando provocar uma desaceleração do crescimento em nível mundial. O iene fechou a segunda semana de junho com sua menor cotação frente ao dólar nos últimos 8 anos.
No front interno, o Banco Central, mesmo antes do anúncio da recessão japonesa, pela primeira vez desde o início do Real, viu-se obrigado a lançar papéis indexados para rolar a dívida pública. De acordo com Celso Pinto, em sua coluna do JB e da Folha de 05.06.98, o estoque da dívida lastreada nos títulos federais mais negociados no mercado cresceu 58% de dezembro/97 até o início de junho/98. Trata-se de uma dívida cada vez mais cara, com prazos cada vez mais curtos (o “pior dos mundos“). Considerando apenas os papéis, federais mais líquidos (BBC, LBC, LTN, LFT e algumas NBC), o estoque está em R$ 204 bilhões, dos quais R$ 149,7 bilhões (3/4 do total) vencem até a eleição de outubro e R$ 164,2 bilhões (4/5 do total), até o fim do ano.
Resumo: (1) longe de arrefecer, a crise internacional acena com desdobramentos; (2) a situação interna da economia evidencia um quadro preocupante (juros altos+dívida ascendente + crescimento baixo); e (3) a reta final da campanha elevará em vários graus o termômetro do nervosismo.
Diante deste quadro, entretanto, o que de pior pode haver é a falta de tranqüilidade para lidar com a situação. “É preciso encarar o momento com frieza, com serenidade“, recomenda o ministro Malan, em meio aos últimos tremores no Japão.
Tocar os negócios de modo conseqüente, dentro deste quadro de incertezas e num ambiente concorrencial agitado pela abertura da economia, requer a incorporação da serenidade na pilotagem e toda a cautela possível na tomada de decisões, mesmo que se requeiram ousadas. Um erro por precipitação nos dias de hoje é muito mais difícil de corrigir do que já foi há pouco tempo atrás.

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