Até há duas semanas atrás, a economia do país andava sem novidades expressivas, quando, então, começou a queda das bolsas nos EUA, um acontecimento digno de nota.
De fato, desde que houve a desvalorização do real, em janeiro/99,a economia do país, passado o pânico inicial, vem melhorando gradativamente. A inflação mantém-se sob controle, apesar do aumento dos preços administrados pelo setor público; os juros básicos vêm tendo queda gradual, apesar de lenta; as contas do setor público apresentam superávits primários expressivos, apesar de não serem estruturais; a balança comercial (importações exportações) assumiu, favorecida pela desvalorização, tendência de equilíbrio e, até, leve superávit; o fluxo de capitais internacionais restabeleceu-se e foi registrada em 99 entrada recorde de investimentos estrangeiros, favorecidos pela privatizações, mas não só por isso; nos primeiros meses do ano, os indicadores de atividade industrial alcançam patamares próximos da plena utilização. A situação tinha evoluído tão bem, em comparação com os cenários pessimistas do início do ano passado, que, no começo de abril, o governo federal resolveu liquidar antecipadamente, sacando das reservas cambiais, uma parcela de US$ 10 bilhões do empréstimo salvador tomado junto ao FMI, no auge da crise que culminou com a desvalorização do real.
Um fato a acompanhar com atenção: a estratégia de recuperação da economia nacional pós-crise, traçada pelas autoridades da área econômica, com o ministro Pedro Malan à frente (candidatíssimo à sucessão de FHC, se a recuperação der certo), baseia-se num gradualismo que tem duas faces, uma positiva e outra negativa. A positiva é que foi feita a um custo social muito menor que a levada a efeito pelos países asiáticos, palco de recessões econômicas severas (em 99, para uma recessão esperada de 4%, houve crescimento de 1% no Brasil). Já a face negativa da estratégia de recuperação da economia é que deixa o país muito vulnerável à situação externa. Segundo o comentarista econômico Celso Pinto (na coluna de 09.04.2000, reproduzindo opinião do ex-diretor do Banco Central, Francisco Pinto), o ajuste nacional depende de três condições essenciais: (1) haver disposição política para continuar gerando superávits fiscais primários da ordem de 2,5 a 3% do PIB por vários anos; (2) gerar saldos crescentes da balança comercial; e (3) não haver crise externa séria (para não afetar o fluxo de capitais, da ordem de US$ 23 bilhões em 2000, de que o país precisa para fechar o seu balanço de pagamentos).
Com o rebuliço provocado pela queda recorde da Nasdaq, a bolsa de valores “eletrônica” (que negocia as ações das empresas da chamada nova economia), na semana passada, essa última condição pode ficar comprometida. Por que? A economia norte-americana vem crescendo a taxas elevadas para os seus padrões há quase dez anos seguidos, com inflação baixa e pleno emprego. Esse fato vinha alimentando uma verdadeira euforia no mercado de ações, sobretudo as ações das empresas da Internet, negociadas na Nasdaq. As pessoas endividam-se junto aos bancos para comprar ações, ganhar com sua valorização, pagar o empréstimo feito e gastar o resultado em consumo, realimentando o aquecimento da economia. A situação chegou a tal ponto que Alan Greespan, presidente do Fed (Federal Reserve), banco central norte-americano, vem promovendo, desde o ano passado, a elevação gradual da taxa dos juros básicos para combater o que ele chama de “exuberância irracional” do mercado de ações e da economia aquecida.
Confirmando-se, portanto, uma queda muito acentuada das bolsas (a da “nova” arrastará a da “velha” economia), isto poderá afetar bruscamente o desempenho da economia norte-americana e, por consequência, a economia brasileira que sofrerá com a sua excessiva dependência externa (em época de crise o capital fica escasso e arredio). É bom acompanhar com atenção o desenrolar dessa trama e ver no que vai dar.