Vitória da democracia

Encerradas as apurações das eleições para prefeito nas 31 cidades onde houve segundo turno, uma constatação evidente: independente de qual foi o candidato eleito, no país inteiro verificou-se a vitória inequívoca da democracia. Foram quase 110 milhões de eleitores cadastrados votando para prefeitos e vereadores em 5.559 municípios. Desses, 26 milhões participaram de nova votação no segundo turno. São números espantosos que mostram a magnitude do feito, principalmente quando, com as urnas eletrônicas (322.500 instaladas no primeiro turno), temos as apurações concluídas poucas horas após o encerramento da votação e os resultados do segundo turno divulgados antes do dia terminar. Inclusive, com o avanço da tecnologia, sem questionamentos quanto à lisura das apurações.
Tanto no primeiro quanto no segundo turno, sobretudo neste último domingo, o que se verificou foi uma verdadeira festa nas ruas, com partidários dos candidatos demonstrando com fervor sua “torcida.” Um espetáculo bonito de se ver, sem nenhum registro de incidente grave, mesmo nos locais onde a disputa foi particularmente acirrada.
Essa experiência bem sucedida é muito boa para o país. Por suas dimensões e pela magnitude tanto dos seus problemas quanto das suas oportunidades, o Brasil não tem saída civilizada fora da democracia, por mais difícil e custoso que seja seu exercício entre nós. E é, justamente, esse exercício que deve ser radicalizado pelo voto e pelas eleições periódicas.
Somos uma sociedade surpreendente, em muitos aspectos singular no mundo. Uma sociedade que em cerca de 50 anos (dos anos 30 aos anos 80) trocou o seu perfil de 80% rural para 80% urbana, inchando as cidades, sobretudo as capitais, muitas das quais palco de segundo turno na atual eleição. Um ritmo de mudança tão intenso não poderia deixar de exacerbar os conflitos, substancialmente agravados por uma das piores distribuições de renda do planeta.
É essa sociedade complexa que, num mundo cada vez mais exigente e impactado pelos processos de globalização, não tem outra saída fora da democracia. Francisco de Oliveira, professor titular de sociologia da USP, ex-superintendente-adjunto da SUDENE na época de Celso Furtado, foi enfático em recente conferência no Seminário de Tropicologia da Fundação Joaquim Nabuco no Recife (segundo ele próprio, no seu “primeiro texto otimista em dez anos”):

“Se soubermos trabalhar a complexidade do mundo moderno, se formos capazes de radicalizar a democratização da sociedade brasileira, podemos nos sair bem no processo de globalização.”

Francisco de Oliveira

Trata-se de um desafio muito grande mas inescapável. Um desafio a ser enfrentado com disposição ao confronto de projetos e à negociação de opções para que se avance nas soluções sociais e na superação das nossas mazelas, já tão conhecidas. Quando votamos naquele que achamos o melhor, independente de quem seja, estamos, obrigatoriamente, correndo riscos que só podem ser enfrentados pela opção complementar de continuar reforçando a democracia. Erros, se existirem, o próprio processo democrático permite consertar mais na frente. Parabéns ao país. Avançamos.

Assim como a Internet e as tecnologias, o Conjuntura & Tendências também está mudando. A partir de 13 de novembro. AGUARDE.

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