Depois de uma ofensiva diplomática, aparentemente bem sucedida de quase um mês, os EUA iniciaram a ofensiva militar ao Afeganistão, ao que tudo indica, com o objetivo de desestabilizar a milícia Taleban e estabelecer um governo aliado no país. O que vai acontecer, é difícil antecipar, mas, certamente, é mais um passo no sentido da consolidação de uma ordem nova de coisas (ver a respeito o número 344).
Trata-se, efetivamente, da primeira guerra do século 21. Um evento que muda o conceito tradicional de guerra (dois oponentes lutando pela conquista de determinado território) que, já abalado com o fim da chamada guerra fria, está sendo, agora, revisado. Contra um inimigo que atua em rede, sem base territorial definida ou bastante dispersa, a ação combativa, como bem lembra o sociólogo espanhol Manuel Castells, também tem que ser em rede e é, forçosamente, de longa duração. Mesmo que as ações pontuais possam ser episodicamente rápidas.
A luta, ou guerra como querem alguns, contra o terrorismo internacional é uma ação de paciência e inteligência que envolve, como já aconteceu recentemente, a tentativa de desarticulação do esquema financeiro do inimigo, uma ação diplomática vigorosa, uma mobilização midiática (dos meios de comunicação) abrangente e a utilização intensa dos sistemas de inteligência e espionagem.
Contra um inimigo invisível e territorialmente pulverizado, as ações visíveis, como o ataque ao Afeganistão, por exemplo, têm mais um efeito de demonstração do que qualquer outra coisa. Tudo leva a crer que terá que ser continuada por uma ação multifaceta e eficaz, inclusive porque, depois da reação norte-americana, há a probabilidade, nada desprezível, de que sejam feitas outras tentativas terroristas contra alvos norte-americanos, dentro ou fora dos EUA.
O grande receio de todos é que o novo lance possa vir em forma de um ataque terrorista com utilização de armas químicas ou biológicas de grande poder destrutivo, sem que se descarte, mesmo, a terrível possibilidade nuclear. Só a menção da probabilidade desse cenário catastrófico, lança dúvidas bastante sombrias sobre o futuro. O que virá daqui para a frente, no ambiente internacional é muito pouco previsível.
Do ponto de vista econômico, as dúvidas também são grandes. O crescimento mundial que já vinha comprometido com a desaceleração das economias norte-americana, japonesa e européia, pode se ressentir mais ainda com os acontecimentos recentes. Se isso acontecer, as conseqüências serão mais danosas ainda para o Brasil.
Devido à vulnerabilidade de suas contas externas e à necessidade de aportes significativos de capitais por intermédio de investimentos estrangeiros, o Brasil pode vir a ser afetado mais do que já está sendo. Os recursos de que o país precisa para fechar suas contas virão com mais dificuldade. Em momentos de aumento de incertezas, ocorre o fenômeno intitulado fly to quality, ou seja, o dinheiro busca segurança e fica avesso a riscos maiores. E, como se não bastasse, para 2002 esse cenário recebe o reforço importante de uma componente interna: a eleição presidencial. Com isso, as incertezas aumentam e tudo leva a crer que não será um ano fácil.
Em meio a toda a instabilidade, todavia, dois aspectos positivos. Em primeiro lugar, a postura norte-americana de, contrariando as expectativas iniciais, anteceder a ofensiva militar de uma grande ofensiva diplomática, oposta, inclusive, às diretrizes primeiras do governo Bush de manter-se distante dos conflitos internacionais. Essa atitude traz esperanças de um desdobramento menos bélico.
Em segundo lugar, a posição do Brasil como país pacífico e pacifista, sem conflitos bélicos com seus vizinhos desde a Guerra do Paraguai e sem participação em enfrentamentos militares desde a Segunda Guerra. No novo cenário internacional essa característica pode mudar a posição política do país num mundo carente de mediadores isentos. Vamos ver.