Em recente evento da Câmara Americana de Comércio em São Paulo (Business Round Up 2002), Celso Pinto, Diretor de Redação e colunista do jornal Valor Econômico (co-patrocinador do evento), expôs o que considera serão os principais constrangimentos / restrições do governo Lula em 2003.
1. Ambiente Internacional
A economia norte-americana continua cambaleante, ameaçada de recessão. A aversão ao risco, turbinada depois dos escândalos das grandes corporações, que afugenta o investimento nos países emergentes, continua grande. É expressiva a ameaça de guerra ao Iraque.
2. Retomada da Inflação
Com a permanência do dólar acima dos R$ 3,00, é muito grande a pressão para o repasse aos preços internos. Os índices de preço no atacado já estão anualizados na casa dos 20% e os de preço ao consumidor na dos 10%. A pressão adicional de indexação de preços e salários será muito forte em 2003.
3. Crédito Interno
Grandes grupos nacionais, por conta da inédita restrição de crédito externo, nos setores aeroviário, de telecomunicações, elétrico, de papel e de mídia, estão enfrentando sérios problemas de caixa. Se a escassez continuar forte, outros setores podem ser atingidos e pode haver risco de crise sistêmica.
4. Ajuste Fiscal
O ajuste fiscal realizado no segundo mandato FHC foi feito com base em receitas extraordinárias que não se repetirão. Inclusive o orçamento 2003 está desfalcado de R$ 15 bilhões de receitas extras. Não há mais espaço para acréscimo de receitas via aumento de impostos (a carga tributária já está em 35% do PIB).
5. Capital Político
Diante de um cenário de crescimento medíocre e da ameaça da retomada da inflação, junto com a promessa de realização de reformas difíceis, o capital de esperança recebido pelo novo governo corre o risco de se exaurir rapidamente se ele não conseguir, em curto espaço de tempo, executar uma agenda positiva e dinâmica.
Como aspectos facilitadores, para enfrentar essas restrições e permitir a impressão de um ritmo forte de partida, o governo Lula tem, além do já citado capital político, os resultados do extraordinário ajuste das contas externas que está sendo realizado pelo saldo recorde da balança comercial (US$ 12 bilhões, contra uma estimativa otimista, no início do ano, de US$ 6 bilhões).
Com esse saldo e um pouco de sorte, o novo governo poderá iniciar a reversão das expectativas negativas dos investidores externos, refletidas de forma cruel no risco-país acima de 1.500 pontos, quando a média dos países em desenvolvimento, excluída a Argentina, é de 600 pontos (nível em que o Brasil esteve em 2000).
Essa retomada da confiança externa é fundamental para que se restabeleçam o fluxo de capitais e as linhas de crédito externas, sem o que continuará presente a ameaça de risco sistêmico e a pressão sobre o câmbio, com a conseqüente pressão sobre os preços internos.
A favor de um círculo virtuoso que pode, apesar das dificuldades, começar a se estabelecer em 2003, além do capital político de esperança, do ajuste externo em curso e da sorte, existem algumas conquistas institucionais que serão recebidas como boa herança dos anos FHC. São elas: (1) Lei de Responsabilidade Fiscal; (2) sistema de câmbio flutuante; (3) sistema de metas de inflação (que precisa ser ajustado mas mantido); e (4) um orçamento mais sério, com metas fiscais incluídas.
Caberá ao novo governo, de par com o conteúdo programático mais social que tentará imprimir à atuação pública no país, equilibrar esses fatores restritivos e impulsionadores para conseguir uma ação conseqüente. Esse é, de resto, o desafio de toda gestão, pública ou privada, que se pretende estratégica.