Â
Nos últimos dias, com a divulgação dos indicadores mais recentes, tem-se intensificado na mÃdia o debate sobre o desaquecimento da economia e o risco, que alguns analistas consideram sério, de a coisa descambar para uma recessão forte.
Verifica-se contenção do consumo, diminuição das vendas no comércio e queda da atividade industrial, tudo pressionado pelas altas taxas de juros praticadas pelo sistema financeiro, ramificadas a partir da taxa básica estabelecida pelo Banco Central (a taxa Selic, ainda no patamar dos 26,5%).
O atual desaquecimento constitui-se, na prática, numa herança de anos de crescimento baixo, potencializada pelos juros atuais, num ambiente de aumento da carga tributária, como muito bem caracteriza Yoshiaki Nakano, ex-secretário da Fazenda do governo Mário Covas, diretor da Escola de Economia da FGV/SP, em excelente artigo recente:
âNos últimos cinco anos o PIB cresceu em média apenas 1,6% a. a., isto é, praticamente a mesma taxa de crescimento da população. Isto significa que a renda per capita não cresceu. Ainda, como a participação das exportações e dos gastos do governo no PIB aumentou, o consumo privado caiu. Assim, em média, cada brasileiro consome menos hoje do que há cinco anos e paga muito mais impostos.â?
Yoshiaki Nakano, economista, Valor, 05.06.2003
O governo Lula herdou esse passivo acrescido de um perigoso surto de crescimento acelerado da inflação, e, por via das dúvidas, intensificou o arrojo monetário (aumentou o superávit primário das contas públicas, os juros básicos e o depósito compulsório dos bancos), enxugando o dinheiro em circulação e deprimindo a atividade econômica.
Como resultado, obteve, ajudado pela reversão das expectativas internacionais e pela desvalorização do dólar, a queda da inflação, embora mais lenta do que o esperado. Todavia, apesar disso, tem recebido uma contestação crescente, principalmente de aliados polÃticos.
A polÃtica macroeconômica adotada pelo governo tem, inclusive, servido de amplificador das manifestações contrárias à proposta de reforma da Previdência pelo governo ao Congresso, provocando as primeiras vaias recebidas pelo presidente no congresso da CUT e a passeata que reuniu 30 mil pessoas na Esplanada dos Ministérios em BrasÃlia na semana passada.
Essa polÃtica, particularmente, tem sido objeto de contestação por parte de empresários, parlamentares e intelectuais do próprio PT ou ligados ao partido. Um deles, Ricardo Carneiro, economista e professor da Unicamp, além de um dos mais ativos colaboradores do programa de governo do PT, chega a projetar em sua crÃtica o tamanho necessário da queda dos juros básicos:
âA possibilidade de essa polÃtica conduzir a uma recessão de grande magnitude é real. Para evitá-la, há que modificar a polÃtica financeira, diminuindo a taxa de juros, que poderia cair até três pontos percentuais sem provocar fuga de capitais do paÃs.â?
Ricardo Carneiro, Folha de S. Paulo, 14.06.2003
Um dos mais tradicionais intelectuais do PT, Francisco de Oliveira, sociólogo e professor emérito da USP, ao receber o tÃtulo de cidadão paulistano, no último dia 13.06.2003, chegou a inverter o slogan petista para caracterizar a atuação do governo até agora:
âO medo venceu a esperança.â?
Francisco de Oliveira, Folha de S. Paulo, 14.06.2003
Até quando o governo agüentará essa pressão é uma incógnita. A decisão do Comitê de PolÃtica Monetária (Copom), do Banco Central, sobre os juros, nesta semana, dará uma pista.