Com a apuração completa dos votos dados no primeiro turno das eleições municipais, fica evidente a reconfiguração do quadro político no país.
A distribuição dos 95.181.774 votos válidos para prefeito foi a seguinte: o PT teve 16.326.030 (17,15%); o PSDB teve 15.747.592 (16,54%); o PMDB teve 14.249.339 (14,97%); o PFL teve 11.234.656 (11,80%); e os menores partidos (PP, PDT, PTB, PL, PPS, PSB, PV PC do B, Prona, PSTU e outros) obtiveram 39,54%.
O PT, campeão em número de votos, teve um crescimento de 36,75% em relação à eleição municipal do ano 2000. O crescimento do PSDB foi de 16,49% e o do PMDB foi de 7,48%. Já o PFL teve uma queda de 13,40%.
Curiosamente, foram os partidos nanicos e pequenos que mais cresceram em termos percentuais da eleição de 2000 para a de 2004: o PC do B (que teve 0,93% do eleitorado e cresceu 132,24%); o PV (com 1,43% do eleitorado e crescimento de 111,83%); o PL (com 5,28% do eleitorado e crescimento de 97,70%); o PSTU (com 0,19% do eleitorado e crescimento de 86,57%); e o PPS (com 5,20% do eleitorado e 41,15% de crescimento).
Da observação do quadro pós eleitoral, podem ser tiradas algumas conclusões importantes. A primeira delas é que o PT e o PSDB, com essa eleição, se convertem nas duas principais forças políticas do país. A segunda é que os dois outros partidos grandes (PMDB e PFL), apesar de conservarem, ainda, grande número de prefeituras, com algumas poucas exceções (inclusive as que possam ser decorrentes dos resultados a se verificarem nas 44 cidades onde haverá segundo turno no próximo dia 31), foram empurrados dos grandes centros urbanos para o interior do país (para onde o jargão político convencionou chamar de “grotões”).
Além desse fortalecimento do PT e do PSDB, outro fenômeno interessantíssimo foi o enfraquecimento das oligarquias e das lideranças populistas regionais. A família Sarney foi derrotada no primeiro turno em São Luís; Antonio Carlos Magalhães escapou de ficar fora do segundo turno em Salvador por insignificantes 0,26% dos votos; Tasso Jereissati foi derrotado em Fortaleza; Antony Garotinho perdeu feio no Rio de Janeiro; e Paulo Maluf, ao que tudo indica, com os 11,94% dos votos obtidos, encerrou sua carreira política em São Paulo.
Esses resultados parecem indicar um avanço em termos de amadurecimento político do país, como destaca o professor da Universidade Federal de Pernambuco Michel Zaidan na última edição da revista Veja:
“Já que o Congresso não faz uma reforma política, o amadurecimento do eleitorado está fazendo-a na prática. (…) tirando espaço dos partidos clientelistas e oligarcas e priorizando siglas com programas mais definidos, em especial nos centros urbanos.”
Michel Zaidan, cientista político, UFPE
Uma mudança, portanto, patrocinada pelo eleitor, de forma ativa, apontando o rumo em direção ao qual a representação política deve trilhar.
“Talvez estejamos assistindo a uma redefinição, pelo eleitorado brasileiro, do campo político em que os partidos devem atuar: mais ao centro, mais previsíveis, com preocupações sociais que pareçam autênticas e um certo verniz ético. Hoje, PT e PSDB são, dentre os grandes partidos, aqueles cujas imagens mais se aproximam desses requisitos.”
Editorial, Folha de S. Paulo, 05.10.2004
Ao que tudo indica, a eleição atual evidenciou mais um avanço da sociedade à frente da política.
“A sociedade brasileira tem sabido se mostrar mais amadurecida do que suas elites políticas.”
Denis Rosenfield, cientista político, UFRS