Não há só aspectos negativosna reeleição de George W. Bush

 
Praticamente todas as análises do resultado da eleição presidencial norte-americana destacam o perfil conservador do eleitorado que deu a vitória ao republicano George W. Bush.
“A América que triunfou foi aquela representada pelos Estados do Sul, da região das Rochosas e de parte do Meio-Oeste – a América interiorana da ‘apple pie’ e dos rifles pendurados nas caminhonetes. Ficaram com Kerry a Costa Oeste, o Nordeste e a parte do Meio-Oeste – a América cosmopolita das universidades e dos centros urbanos sofisticados, como Nova York, Chicago e Los Angeles.”
Editorial da Folha de S. Paulo, 04.11.2004
Todavia, essas análises deram pouco destaque ao fato de que, ao contrário da eleição anterior, desta vez Bush saiu da disputa amplamente legitimado, com o maior número de votos em termos absolutos desde a eleição de Ronald Reagan em 1980.
Foi uma dianteira de mais de 3,5 milhões de votos diretos, vitória folgada no Colégio Eleitoral e maioria na Câmara e no Senado. Muito diferente de 2000 quando perdeu para Al Gore por 540 mil votos diretos. Sem falar na vitória no Colégio Eleitoral por um mísero voto, depois de uma inacreditável e suspeitíssima contenda de contagens e recontagens sucessivas na Flórida, providencialmente governada pelo irmão Jeb Bush.
Agora, quem está sentado na cadeira mais quente do planeta não é mais um presidente eleitoralmente fragilizado para quem o 11 de setembro surgiu como uma oportunidade ímpar de legitimação política pelo apelo ao patriotismo e ao belicismo mais desvairados. Não, agora quem está lá é um presidente que teve a aprovação plena de suas políticas e que mostrou bem mais segurança e clareza que seu fraco adversário.
“John Kerry perdeu porque é insosso e não foi capaz de apresentar ao eleitorado um conjunto de idéias claras.”
Tales Alvarenga, revista Veja, 17.11.2004
Ao contrário, porém, do que possa parecer à primeira vista, a aprovação pode provocar um efeito contrário. Em vez do endurecimento das posições do governo norte-americano, agora legitimadas pelo voto, é bem possível que vejamos até um abrandamento dessas posições já que a necessidade de bravatas diminuiu muito.
No curto e médio prazos, inclusive, a vitória de Bush é melhor para o Brasil, não só pela boa relação pessoal que, curiosamente, estabeleceu com o presidente Lula (que, na brincadeira, chegou a chamá-lo de “companheiro” Bush) como por uma questão pragmaticamente comercial.
“… a vitória de Bush é paradoxalmente melhor para as economias européia e latino-americana: para obter o apoio dos sindicatos, Kerry prometeu mais medidas protecionistas.”
Slavoj Zizet, filósofo esloveno, Mais, 07.11.2004
Esses aspectos potencialmente favoráveis não devem, todavia, de forma nenhuma, entorpecer a constatação de que a legitimação pelo voto também remete à confirmação de tudo o que foi feito no primeiro mandato. O mundo é outro depois do 11 de setembro, coisa que a atual vitória de Bush confirma e fortalece.
“… ele tinha de vencer duas vezes para que os liberais percebessem que estamos todos entrando em uma nova era.”
Slavoj Zizet
Uma era onde segurança e maniqueísmo estão em alta. Onde a luta do “bem” contra o “mal” está fortemente disseminada nas relações internacionais, com as trágicas repercussões que vemos todos os dias pela televisão.

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