Uma das questões mais intrigantes que a Segunda Guerra Mundial deixou para a humanidade foi a do verdadeiro fascÃnio, logo transformado em delÃrio coletivo, que Adolf Hitler exerceu durante mais de uma década junto, praticamente, à totalidade da nação alemã.
“…para fazer o que fez, para chegar ao poder e para exercê-lo, Hitler precisou ser amado, respeitado e admirado.”
Revista História, maio/2005
De fato, Hitler chegou ao poder pelo voto popular em 1933 (depois de uma frustrada tentativa de golpe dez anos antes) e manteve-se nele com apoio amplamente majoritário e crescentemente fanático da população.
O curioso é constatar que toda a pregação do führer (hegemonia da nação alemã, predomÃnio da raça ariana, combate sem tréguas aos judeus etc.) era feita por um sujeito nascido na Ã?ustria, de tipo fÃsico nada ariano e, dizem, até, com um remoto parentesco judaico. Uma nÃtida dissonância entre a mensagem e o agente emissor, aliás, solenemente desconsiderada pela platéia, ávida por um salvador da pátria.
“Derrotada e humilhada pelo Tratado de Versalhes, a Alemanha ansiava por retomar seu orgulho. Hitler prometia uma Alemanha grande e forte outra vez.”
Ian Kershaw, historiador britânico
Por certo, esse sonho prometido foi o principal motor de toda aquela euforia mÃope que, como não poderia deixar de ser, terminou em tragédia e das grandes. O III Reich que iria durar 1.000 anos, só durou 12.
A questão-chave talvez esteja aÃ: a esperança de retomada da glória alemã que Hitler prometia a uma nação humilhada fez dele um lÃder popular que conseguiu fechar os olhos da opinião pública para as loucuras e atrocidades que seriam cometidas depois.
“Sei que a afirmação pode soar chocante, mas ele pode ter sido o lÃder revolucionário mais popular da história do mundo moderno. à claro que esse processo foi gradual e recebeu uma baita ajuda da repressão que Hitler e sua organizações paramilitares instauraram desde sua subida ao poder.”
John Lukacs, historiador norte-americano
A lição que se pode tirar disso, tanto do ponto de vista polÃtico quanto organizacional (sendo a organização entendida como uma espécie de microcosmo da polÃtica) é a de que mesmo as maiores violências e os maiores equÃvocos podem ser cometidos quando se consegue manipular a opinião pública com a esperança de dias melhores. Sobretudo quando essa manipulação se assenta no desejo de revanche.
“A Segunda Guerra Mundial foi deflagrada por marechais e estrategistas, mas engendrada pelo êxtase populista, pelas ideologias sumárias, simplificadas pelo rancor.”
Alberto Dines, jornalista brasileiro, coluna de 08.05.2005
O curioso é que para o “bem”, ou seja, para a mobilização positiva, a esperança é um grande e, mesmo, indispensável recurso da gestão (ver, a propósito, o Gestão Hoje número 380). Se é assim, então, a pergunta que se impõe é: quando, então, a utilização da esperança como fator de mobilização é “ilegÃtima”?
A resposta a pergunta dessa natureza não é, evidentemente, fácil. O que é legÃtimo para uns não o é para outros. Mas uma coisa parece certa: a resposta depende dos propósitos, do para quê. Ã, também, importante observar: o nÃvel de manipulação e de fanatismo envolvidos. Quando forem grandes, com certeza, a esperança estará sendo usada indevidamente.