A crise requer comando unificado enão apenas tentativa de solução negociada

 
Assim como a saúde, há muitas coisas em relação às quais só nos damos conta de como funcionavam bem quando passam a funcionar mal. Esse é o caso flagrante do setor aéreo no Brasil em 2006. Neste Natal, a desorganização do tráfego (já comentada no GH/614), assumiu os temidos contornos de um “apagãoâ€?, sinalizando aquele que provavelmente será avaliado como o pior ano da aviação civil no Brasil.

“Somente nos últimos três meses, houve o acidente da Gol e a crise nos aeroportos — que começou com a operação-padrão dos controladores de vôo, passou pela quebra de um equipamento do Cindacta 1, em Brasília, e culminou na retirada de circulação de seis aeronaves da TAM. Nesse período, mais de 3 mil vôos foram cancelados e 212 mortes registradas.â€?

Henrique Gomes Batista, O Globo, 24.12.06

Nos principais aeroportos do país, no fim de semana do Natal, viu-se de tudo. Atrasos de vôos que chegaram, em casos extremos, a 48 horas. Passageiros revoltados, dormindo pelos cantos e invadindo as pistas em protesto pela desatenção e, sobretudo, pela falta de informações. O próprio ministro da Defesa, um dos responsáveis pela gestão da crise, foi flagrado esperando um vôo atrasado quatro horas no aeroporto de Brasília. A desorganização foi tanta que o presidente Lula viu-se obrigado a intervir pessoalmente autorizando o empréstimo de dez aviões da Força Aérea Brasileira (FAB), dentre os quais os famosos Sucatão (antigo avião presidencial) e o Sucatinha (usado pelos ministros), para transporte dos passageiros abandonados pela TAM.
Na base das causas da situação atual, encontra-se, sem dúvida, o crescimento da demanda que não foi acompanhado pela oferta nem pela atualização adequada da infra-estrutura. Pelo contrário, até. Com a quebra da Varig, o setor desorganizou-se. Só no primeiro semestre, o tráfego aéreo cresceu 22,6% em relação ao mesmo período de 2005. Já a demanda por assentos em 2006 subiu 13%, enquanto a oferta cresceu apenas 7,8%. O próprio presidente Lula, no auge da última crise, manifestou-se sobre o assunto.

“Temos um bom problema, que é o crescimento do número de passageiros. E temos um mau problema, que é que o Brasil hoje não tem a Varig.â€?

Luis Inácio Lula da Silva, 22.12.06

Essa situação de descompasso entre oferta e demanda agravou-se muito com as indefinições e atrapalhos institucionais e gerenciais a que vem sendo submetida a gestão do setor. Ministério da Defesa, Aeronáutica, Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), Infraero, embolam-se na tentativa de coordenação negociada de um setor que, além de desorganizar-se, entrou em crise.

“Tentar uma solução negociada numa crise só vai agravar os problemas.â€?

José A. do Patrocínio, professor FGV, O Globo, 07.12.06

A crise requer unidade de comando. Em situação similar quando, no governo FHC, a sociedade correu o risco de um “apagãoâ€? elétrico, para coordenar as inúmeras instituições do setor e encontrar uma saída para o problema, foi nomeado o então ministro da Casa Civil, Pedro Parente. À frente da Câmara de Gestão da Crise conduziu a situação até o fim do racionamento.

“É preciso ter alguém que encarne essa função. Alguém com autoridade e responsabilidade simultaneamente.â€?

José A. do Patrocínio, professor FGV, O Globo, 07.12.06

No último capítulo da novela aérea, quem assumiu esse papel foi o próprio presidente. Esperemos que não precise permanecer nele por muito tempo.

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