A hegemonia chinesa dependede uma transição política bem sucedida

 
A observação in loco da realidade e do atual estágio de desenvolvimento da China não deixa nenhuma dúvida sobre qual a intenção estratégica dos dirigentes chineses em relação ao resto do mundo, conforme destaca com muita propriedade a abertura da reportagem especial da revista Veja de 09.08.06 que identificou “uma disposição incomum dos entrevistados de todas as idades em se medir com os demais países”.

“Eles querem ser os líderes e, em todos os campos, superar os países ricos.”

Mônica Weinberg, editora de educação

Essa impressão que se instala no observador e fica registrada na impressão dos repórteres, confirma-se pelas pesquisas de opinião. Os chineses apóiam a determinação dos seus dirigentes.

“Uma pesquisa de âmbito global confirma: os chineses são o povo mais otimista do mundo no momento. Nada menos que 81% estão satisfeitos com os rumos do país.”

Veja, 09.08.2006

Neste terceiro e último número do GH desta série sobre a China, vale a pena considerar a questão levantada na edição anterior (ver número 643) como principal obstáculo político à consecução desse ambicioso objetivo: será que a transição para o regime de maiores liberdades se fará sem grandes traumas como, por exemplo, os que foram sofridos pela Rússia? Para o estudioso inglês Anthony Saich, professor da Escola Kennedy de Governo da Universidade de Harvard, autor do livro “Governance and Politics of China”, o exemplo da Rússia foi fundamental para a mudança chinesa.

“A lição que Deng Xiaoping tirou disso foi que, se não mantivesse a economia crescendo, a China iria cair também.”

Anthony Saich, Folha de S. Paulo, 30.07.06.

Visto a partir da perspectiva atual, o timing da mudança econômica feita pela China parece ter sido perfeito na medida em que impediu a fragmentação sofrida pela Rússia e mantém o país unido pela crença na conquista da liderança mundial. Nesse particular, o crescimento passou a ser fiador político do regime.

“O modelo chinês se ressente da falta de flexibilidade política para lidar com possíveis crises na economia. O crescimento tornou-se a fonte de legitimidade do regime. Nesse aspecto a Índia tem vantagem sobre a China.”

Anthony Saich

Ao contrário da China, a também emergente Índia, com uma população da mesma ordem de grandeza mas com um PIB menor, fez uma transição de modelo econômico (socialista) e fortaleceu um regime político bem mais aberto.

“A Índia pode lidar com uma queda dramática no crescimento. Troca o governo, passa por uma crise, mas vai adiante. A China não tem um sistema político que possa se manter perpetuamente. Se eles administrarem a transição política como administraram a econômica, todos serão felizes. Mas não há garantias. É uma transição perigosa e a maioria dos países tende a fazê-la em momentos de crise.”

Anthony Saich

Para garantir a estabilidade política a China precisa continuar crescendo e, para isso, precisa fazer a transição política. Conseguindo manter o crescimento, dentro de algumas décadas, será líder mundial. Se o mundo agüenta o crescimento chinês, bom, aí já é uma outra história…

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