por Francisco Cunha, sócio da TGI Consultoria em Gestão
O Futuro Multimodal no Recife
Outro dia estava indo para uma reunião com um cliente em Boa Viagem quando acende uma luz vermelha esquisita no painel do carro. Ligo para a assistência técnica e a recomendação é curta e grossa: “pare porque o motor pode bater”. Obediente, depois que encaminhei o veículo à concessionária, segui de taxi para o cliente. Quando terminei a reunião me vi, às 18h de uma sexta-feira, numa Av. General Mac Arthur (continuação da Antônio Falcão) completamente paralisada. E agora? Sem carro, sem taxi, sem nada, resolvi ir caminhando até a Imbiribeira na esperança de maior fluidez e… um taxi. De repente, passo por baixo do Metrô e decido pegar o trem até a estação central. “Lá deve ter taxi”, pensei. Acomodo-me num vagão relativamente cheio. Na estação seguinte, entra mais um bocado de gente e fui parar no meio do vagão até a estação Joana Bezerra quando esvaziou um pouco e consegui sentar. Chego na estação central e nada de taxi. Resolvo ir andando até a Guararapes. “Lá tem”. Nada! Já sem esperança, vejo um ônibus com “Alto…” escrito no letreiro. “Alto é lá pro lado de minha casa” (no Parnamirim), pensei e entrei. Tinha uma cadeira vaga com a placa “obeso” do lado. Sentei com o cuidado de ceder o lugar quando aparecesse um obeso… Não apareceu. Olhei em volta e vi muita gente entretida com os seus celulares: um via novela, outro ouvia música com fone de ouvido, outro parecia navegar na internet… O ônibus partiu e, para minha surpresa, seguiu rapidamente, sempre pela faixa da direita, até a Av. Norte e, por ela, também supreendentemente rápido, até perto da Tamarineira, quando entrou à direita para os lados de Água Fria. Pedi parada, saltei e fui andando para casa. Quando cheguei, olho o relógio: 19h15. “Se tivesse vindo de carro, com certeza ainda estaria engarrafado pelo caminho…”. Enquanto tomava banho, conclui meio espantado que tinha utilizado três modais em cinco trechos (a pé – metrô – a pé – ônibus – a pé) e tinha feito o percurso total em menos tempo do que se tivesse utilizado o modal carro. Moral da história da aventura multimodal acidental: o modal carro encontra-se numa terrível encruzilhada (engarrafada) e não pode mais resolver sozinho o problema da mobilidade do seu proprietário.
Precisamos exigir melhores condições para os modais
Na prática, pude comprovar um fato que já suspeitava na teoria: o futuro da mobilidade urbana no Recife (e, por extensão, nas grandes cidades brasileiras) é multimodal como, de resto, o é nas cidades que resolveram o problema ao redor do mundo conforme se pode ver, por exemplo, em Paris e Nova York onde só usa carro quem gosta de sofrer. Precisamos exigir melhores condições para os modais a pé, bicicleta e transporte coletivo uma vez que o sonho delirante de resolver tudo de automóvel parece ter ido mesmo para o beleléu.
*Artigo publicado na edição 90 da revista Algomais (www.revistaalgomais.com.br).