Eu, Capibaribe

por Francisco Cunha, sócio da TGI Consultoria em Gestão
O Capibaribe ressurge como oportunidade única de ‘recostura’ do território da cidade.
O recém-lançado livro “Eu, Capibaribe” traz um depoimento meu sobre o nosso rio que teve que ser editado por questão de espaço. A seguir reproduzo, por pertinente, o depoimento completo:
“Assim como se diz que o Egito é uma dádiva do Nilo, não é descabido dizer, por analogia, que o Recife é uma dádiva do Capibaribe desde os remotos tempos geológicos em que o nível do mar (mais alto) fazia da hoje planície do Recife
uma baia oceânica que terminava no sopé das colinas circundantes. Depois que o mar recuou, foi o Rio Cabibaribe o principal agente que promoveu com sedimentos o ‘atulhamento’ da baia e formou a planície atual.
Quando o colonizador português chegou e encontrou no massapê da várzea do Capibaribe o solo ideal para fazer do açúcar uma commodity mundial, a ocupação da planície do Recife passou progressivamente dos engenhos para os sítios, deles para os loteamentos e, por fim, para os bairros. Até a segunda metade do século XIX, o Capibaribe foi um meio privilegiado de integração do território como via de transporte de gente e mercadorias, além de lazer, até que os veículos motorizados tomaram conta da mobilidade e o território se desintegrou com o rio se enchendo de esgoto e lixo.
A parte boa da história é que o rio, mesmo sujo e relegado a segundo plano, continua lá, no lugar dele e, no momento em que a solução motorizada terrestre mostra-se completamente saturada e em vias de estrangulamento, o Ca-pibaribe ressurge como oportunidade única de ‘recostura’ do território da cidade. Como? Além da navegabilidade, criando-se uma via mista de pedestre e ciclista, nas margens, próxima e em meio à vegetação, sem concorrer com os carros, do bairro da Várzea até o centro da cidade e o Parque dos Manguezais em Boa Viagem, perfazendo mais de 20 km contínuos.
Essa solução é um verdadeiro ‘ovo de colombo’ urbanístico pois permite, a custos baixíssimos, uma profunda revolução na mobilidade urbana (imagine-se, por exemplo, a pessoa sair da Várzea de bicicleta e chegar no centro da cidade antes de quem vai de carro…).
Com uma solução desse tipo, ainda há tem-po de salvar o rio, na sua foz, reintegrando-o à cidade e, com isso, promovendo, em contrapartida, a reintegração da própria cidade consigo mesma.
O poeta alemão Friedrich Holderlin (1770-1843) escreveu: ‘onde está o perigo, cresce também o que salva’. Perigos na nossa cidade, temos de sobra. É chegada a hora de ir atrás do que salva. E o Capibaribe é, com certeza, a nossa maior oportunidade de salvação. Vamos a ela!”
*Artigo publicado na edição 93 da revista Algomais (www.revistaalgomais.com.br).

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