“A partir daí, tudo pode acontecer, inclusive nada, como diz o ditado popular, embora, dadas as características dos contendores, “nada” seja o menos provável.”
Logo nos primeiros dias de 2020, os EUA, em ataque relâmpago e fulminante no aeroporto de Bagdá, eliminaram o general iraniano Qasem Soleimani, considerado o segundo personagem mais poderoso do Irã, atrás apenas do aiatolá Ali Khamenei, sucessor do aiatolá dos aiatolás, Ruhollah Khomeini, líder inconteste da revolução iraniana de 1979 que depôs o famoso xá Reza Pahlav.
Sem entrar no mérito dos argumentos usados pelo presidente Donald Trump para justificar o ato, o fato é que, imediatamente, sobreveio uma grande incerteza sobre o cenário internacional, mudando completamente a “temperatura” das tendências predominantes para o ambiente externo que fecharam as projeções do ano de 2019 para o de 2020.
Esse acontecimento que, depois de ocorrido, pode parecer até óbvio, nos chama a atenção para, justamente, uma espécie de inverso do óbvio que é a incerteza diante do grande leque de possibilidades disruptivas, a partir de uma aparente ordem que nos incentiva a projetar no futuro a pseudo “calmaria” do presente, como se ela estivesse condenada a acontecer para a frente só porque era o estado “normal” até pouco tempo atrás. Que nada! Nós tendemos a esquecer disso mas o “normal” é, justamente, o “anormal”. Afinal, como nos disse o compositor Paulo César Pinheiro na letra da música Mordaça que fez sucesso na década de 1970, incluída no disco O importante é que a nossa emoção sobreviva: “Pois tudo é instável e irregular / E de repente o furor volta”.
E, no caso específico, que potencial de furor! Nada mais, nada menos do que, de um lado, todo o excepcional poderio bélico e de inteligência dos EUA, supremamente comandados por um presidente sobre o qual, o mais brando que se pode dizer é que se trata de uma criatura nada convencional. Do outro lado, toda a carga do fundamentalismo xiita comandado por uma obstinada ortodoxia de tradição milenar muçulmana, herdeira direta do império persa. Dois “ossos” muito “duros de roer”!
A partir daí, tudo pode acontecer, inclusive nada, como diz o ditado popular, embora, dadas as características dos contendores, “nada” seja o menos provável. De “repente”, o ano começa agitado no cenário externo para nós brasileiros que tivemos os últimos anos bem agitados no cenário interno. Mas, estamos aí para isso mesmo, afinal, o importante é que a emoção sobreviva.
*Artigo publicado na edição 166 da revista Algomais (www.algomais.com)