Grande sucesso no controle da hiperinflação que castigava o país há pelo menos vinte anos, o Plano Real foi um fracasso como indutor da retomada do crescimento econômico sustentado. Por quê?
“O real forte prejudicou o setor exportador, estimulou importações e viagens ao exterior e contribuiu para um rápido aumento das obrigações internacionais do país. Em pouco tempo, o Brasil se encontrava em situação de alarmante vulnerabilidade externa. Tanto mais que a sobrevalorização cambial foi combinada com duas outras decisões altamente problemáticas, que deram continuidade a uma linha inaugurada no governo Collor: uma abertura imprudente e unilateral do mercado interno e a liberação prematura dos movimentos de capitais.”
Paulo Nogueira Batista Jr., FSP, 30.06.2004
Essas medidas, que deveriam funcionar por um tempo limitado, foram esticadas por um período muito maior do que seria razoável. O resultado foi o abuso do que se chamava na época de “âncora cambial” (câmbio sobrevalorizado para permitir que as importações pudessem manter os preços internos pressionados para baixo), em combinação com a “âncora monetária” (juros altos para atrair capital externo). Tudo em detrimento da “âncora fiscal” (o controle dos gastos públicos e o equilíbrio orçamentário), a verdadeira âncora de qualquer plano anti-inflacionário.
Por receio de “quebrar o encanto” da estabilização (inflação em queda vertiginosa, aumento da renda e do consumo, real equiparado ao dólar), a “mágica” cambial e monetária perdurou por todo o primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso.
“Em conseqüência, as turbulências foram se sucedendo. O Brasil passou por crises cambiais em 1995, 1997, 1998, 1999, 2001 e 2002. Quase todas as tentativas de retomar o crescimento foram interrompidas por desequilíbrios no setor externo. Desde 1998, viramos clientes cativos do Fundo Monetário Internacional.”
Paulo Nogueira Batista Jr., FSP, 30.06.2004
Por falta de realizar a tempo as mudanças necessárias, a situação se deteriorou a tal ponto que FHC viu-se obrigado, ao fim do seu primeiro mandato e dias antes da eleição, a recorrer às pressas ao FMI e amarrar um pacote de compromissos fiscais que até hoje funciona como elemento de restrição à retomada do crescimento.
“A economia passou então a oscilar entre a recessão e períodos de crescimento medíocre. Os juros altos contribuíram, ademais, para concentrar a renda nacional, aumentar o serviço da dívida pública e desestabilizar as finanças do governo.”
Paulo Nogueira Batista Jr., FSP, 30.06.2004
Como conseqüência da conjugação desses fatores adversos temos hoje uma dívida pública interna que beira 60% do PIB e atinge a cifra recorde de R$ 1 trilhão. Para fazer face à despesa com o pagamento de apenas 50% dos seus juros, o país vê-se obrigado a fazer um esforço fiscal que se traduz num superávit superior a 5% do PIB, conseguido à custa de uma carga tributária que, este ano, deve chegar a 40% do PIB, além de uma contenção duríssima dos gastos públicos.
Para voltar a crescer de forma sustentada num quadro desses, mais do que um anseio nacional, um imperativo ético, só com muita criatividade, determinação e paciência.