… E o câmbio flutuou

O caldo já estava pelas bordas, quando chega Itamar Franco (o “Forrest Gump” mineiro, na expressão do jornalista Luiz Nassif) e com sua já lendária inconseqüência anuncia uma impronunciável moratória que entorna tudo. Resultado: o Brasil assume, de fato, a posição de “bola da vez” da crise financeira internacional e sofre o quarto e mais agudo ataque especulativo às suas reservas desde a quebra do México, em dezembro de 94.No espaço de três dias, em meio à substituição do seu presidente, demissão e readmissão do diretor de fiscalização, o Banco Central muda a política cambial duas vezes e, com isso, coloca por água abaixo o mais renitente dos instrumentos de controle do Plano Real: a chamada âncora cambial.
A flutuação do câmbio na sexta-feira 15 representa a maior ruptura de concepção sofrida pelo Plano Real desde o seu início. Concebida inicialmente para ser substituída pela chamada âncora fiscal (o equilíbrio entre receitas e despesas dos governos federal, estaduais e municipais), a valorização do real frente ao dólar foi o que, de fato, sustentou o controle da inflação, facilitando as importações e forçando a queda dos preços internos, o que chegou a provocar até deflação anual em 98. O custo desta falta de substituição foi altíssimo. Para garantir a cotação artificialmente alta do real, o governo se via obrigado a atrair dólares e manter altas as reservas cambiais, sempre ameaçadas pelas crises sucessivas dos países emergentes. Para isso, tinha que pagar os juros mais altos do mundo que, além de estrangularem financeiramente as empresas nacionais, fizeram subir a níveis perigosos a dívida e o déficit públicos, mandando para o espaço a possibilidade de equilíbrio fiscal e, por conseguinte, da almejada âncora substituta. Com a quebra desastrada da Rússia, em agosto de 98, a temeridade desta política foi rudemente exposta pela interrupção dos fluxos financeiros internacionais. Os investidores correram para as aplicações mais seguras e iniciou-se uma sangria das reservas cambiais que não se interrompeu (embora tenha diminuído) nem com ao anúncio do acordo com o FMI. A coisa estava neste pé, com o governo tentando aprovar o ajuste fiscal acertado com o Fundo e resgatar a confiança do mercado financeiro internacional, quando aparece Itamar e…
Não é possível antecipar o que vai acontecer daqui para a frente. As incertezas ainda são muitas. A flutuação do câmbio ocorrida na sexta-feira significou, na prática, uma maxidesvalorização próxima de 20%. Era mais ou menos esse número que os analistas estimavam para a supervalorização do real. Se a taxa se ajustar neste patamar, a correção terá sido feita quando o país (diferentemente do México, dos tigres asiáticos e da Rússia) ainda dispõe de um nível razoável de reservas cambiais (cerca de U$$ 30 bilhões), sem contar os recursos disponibilizados pelo acordo o FMI que terá que ser renegociado. Isso abre espaço para a melhoria das exportações (os produtos brasileiros ficam mais baratos em dólar no exterior) e, a médio prazo, para a queda mais rápida dos juros. No curto prazo, as dívidas em dólar aumentam e haverá reflexos sobre as taxas de inflação. Como a economia está em recessão, os analistas estimam que o impacto deve ser da ordem de 8 a 10% anuais. O fato de as bolsas de valores terem reagido com euforia (A Bolsa de São Paulo teve a segunda maior alta de sua história) é um bom sinal, embora não seja nenhuma garantia de que tudo vá melhorar.
A hora é grave mas é possível que tenha chegado o momento da descoberta de um caminho novo que, certamente, vai continuar exigindo sacrifícios mas, pelo menos, traz um pouco mais de variação ao cenário desconfortável, quase desesperador, que se tinha para 99. Torçamos, mais uma vez, para que o governo esteja à altura do desafio que se coloca à sua frente porque o câmbio flutuou mas a política econômica ficou no fio da navalha.

Consultoria Interna
O INTG (Instituto de Tecnologia em Gestão) abriu inscrições para o curso Consultoria Interna – A Prática Profissional Numa Abordagem Estratégica, um programa de formação e aperfeiçoamento destinado a profissionais com função técnica ou gerencial cujo principal desafio seja o de exercer, nas organizações em que trabalham, a função de consultores internos. O início será em março e a coordenação é de Cármen Cardoso. Maiores informações no INTG (427.4513) ou na TGI (427.1740).