Enlouquecendo o gerente

 

“O desejo primário de qualquer grupo é enlouquecer o coordenador.”

Ouvido num treinamento de psicanalistas para trabalhar com grupos

Assim como é possível, do ponto de vista sociológico, definir a família como “a célula mater” da sociedade, pode-se, com apoio na moderna teoria das organizações, definir o grupo como a unidade básica da organização. É possível, inclusive, ir além e definir a organização (qualquer que seja ela) como uma “constelação” de grupos. Os grupos responsáveis pela produção, os responsáveis pelas vendas, os responsáveis pela administração etc. E tanto mais bem sucedida será a organização quanto mais conseguir transformar esses grupos em competitivas “equipes de trabalho” (um tipo especial, “apurado” de grupo).
Acontece que, ao contrário do que se possa pensar ou algumas teorias estapafúrdias possam tentar propagar, não existe grupo (nem, muito menos, equipes de trabalho) sem coordenador (bem como não existe coordenador sem grupo). Quem tem um mínimo de experiência de trabalho em grupo sabe que não é possível realizar nenhuma atividade coletiva, nem uma simples reunião de trabalho nem, mesmo, uma pelada de futebol, sem que alguém assuma, ainda que temporariamente, o papel de coordenador da atividade a ser feita. Mesmo que em situações atípicas a investidura se dê por rodízio, eleição ou sorteio, alguém terá que se responsabilizar pela coordenação das tarefas a serem desenvolvidas pelo grupo, sob pena de instalar-se a desordem e a improdutividade.
O normal, o que acontece e continuará acontecendo na grande maioria dos casos, é que alguém assuma o papel diferenciado de coordenador (diretor, gerente, chefe etc.), nomeado ou investido por um superior hierárquico. Aí é que começa o drama. Como o coordenador é instalado em um lugar diferenciado, visto pelos demais integrantes do grupo como privilegiado e, o que é pior, desejado por todos, instala-se, ainda que de modo inconsciente, na cabeça de cada um a pergunta: “por que ele e não eu?“. A partir daí monta-se o “pacto de enlouquecimento” que funciona como um acordo coletivo tácito (de forma predominantemente inconsciente, nunca é demais repetir) a partir de uma formulação individual do seguinte tipo: “se ele enlouquecer não poderá coordenar, não coordenando perderá o lugar e, aí, poderei ter a chance de ser o coordenador“. Os acordos são descumpridos, os prazos estourados, os conflitos amplificados, as coisas imprevisíveis acontecem, os resultados são comprometidos e assim por diante.
Para não se deixar enlouquecer e poder desempenhar a contento o seu papel, o coordenador (aqui entendido como qualquer pessoa que tem a responsabilidade gerencial de liderar outras pessoas num grupo ou equipe de trabalho, com o objetivo de produzir resultados) deve tomar os seguintes cuidados: (1) legitimar-se na liderança pela conduta ética consistente, sem privilegiar nenhum interesse particular, seja de quem for, em detrimento de outros; (2) ser representante fiel tanto dos interesses da sua equipe junto à organização quanto dos da organização junto à sua equipe, equilibrando os esforços de negociação desses interesses; (3) explicitar sempre de forma suportável e mediar, sem ocultações ou privilégios, os inevitáveis conflitos do dia a dia; (4) orientar sua conduta e suas decisões pela ótica dos resultados a serem alcançados, sem fazer concessões às demandas emocionais que surgem pelo caminho; e, juntando numa síntese incomum as orientações do revolucionário cubano e do marechal Rondon, (5) endurecer se preciso for mas não perder a ternura jamais.