2000 melhor do que 1999

Do ponto de vista macroeconômico, há uma espécie de entendimento compartilhado pelos analistas mais respeitados de que o próximo ano será melhor do que foi 99. Nesta mesma época, em 98, os cenários previstos para 99 eram bem mais inquietantes que os traçados hoje para 2000. No final do ano passado, a observação do ritmo de diminuição das reservas cambiais deixava no ar o pressentimento de que alguma coisa séria estava por acontecer. Em janeiro, os receios se concretizaram e assistimos temerosos a desvalorização do real, seguida das mais sombrias previsões sobre o comportamento da economia.
O pior não aconteceu mas as seqüelas não foram poucas. 99 caracterizou-se como (mais) um ano de ajustes (“ano da verdade”) onde a grande maioria, tanto do ponto de vista pessoal como empresarial, sofreu na pele as conseqüências da fragilidade econômica do país e do quanto custa sobreviver e manter-se competitivo numa economia com estabilidade precária. Sem necessidade de recorrer a outros indicadores, basta comparar os faturamentos em dólar de 98 e de 99. Salvo raras exceções, chegamos ao ano 2000 severamente empobrecidos em moeda forte.
Para 2000 as perspectivas são mais animadoras mas há um condicionante a ser observado com cautela. De acordo com economistas que merecem atenção pela análise correta que fizeram do Plano Real e das suas fragilidades, independentemente de filiações partidárias ou ideológicas (gente como Paulo Nogueira Batista Jr., Delfim Netto, Edmar Bacha…), o retorno do crescimento econômico está condicionado pelo controle da inflação e, consequentemente, pelos juros praticados pelo Banco Central.
Explica-se: como o principal trunfo político de Fernando Henrique Cardoso sempre foi o controle da inflação (não é exagero dizer que não sobreviveria politicamente e, talvez, sequer conseguisse terminar seu mandato se o processo inflacionário se reinstalasse com vigor) ele não hesitará em sacrificar a retomada do crescimento econômico (tecnicamente possível após a flutuação do câmbio) se isto for o custo da estabilidade dos preços. Crescimento não combina com juros altos porque o principal responsável pelo cumprimento das metas de inflação (inflation targeting), incluídas com acompanhamento trimestral na última revisão do acordo com o FMI, é o Banco Central e seu instrumento privilegiado de trabalho são os juros para controle da demanda (quanto mais altos os juros, menos crédito, menos estoques, menos compras, menos pressão por aumento de preços mas, também, menos crescimento econômico).
Se conseguir escapar da armadilha dos juros, o que é, inclusive, provável que ocorra (a inflação já começa a retomar a trajetória de baixa, depois de absorver as pressões de alta do final do ano), o governo, se não ocorrerem surpresas desagradáveis, terá boas condições de começar a recolocar o país no rumo do crescimento sustentado (mais de 4% ao ano), como requer nossa angustiante realidade social. Isto é fundamental para que iniciemos a primeira década do próximo século (que só começa mesmo em 2001) em condições de tirar o atraso das duas últimas décadas economicamente ruins.

“Falar em crescimento de 3 ou 4% para o próximo ano não é muito relevante. Será em 2001 que saberemos se sobrevivemos ou não a essas duas décadas perdidas”

Albert Fishlow, economista norte-americano, ex-professor do ministro Pedro Malan, Diário de Pernambuco, 05.12.99