Bate mais quempensa que sabe dirigir

 
Terminado o carnaval, a vida volta ao normal. Há quem diga, inclusive (e não são poucos), que “o ano só começa mesmo depois do carnaval”. Num país de exageros, um pequeno exagero como esse até passa sem ser percebido.
De qualquer forma, talvez seja um bom momento para pensar num aspecto importante para quem tem a responsabilidade de ir tocando o “barco para a frente”, fazendo com que as coisas aconteçam. Uma boa oportunidade, portanto, para pensar no problema da experiência como algo ao mesmo tempo bom e ruim.
É claro que a experiência é, de princípio, algo bom e desejável. Todo o trabalho de produção de conhecimento (a chamada moeda forte desse novo século) é, no fundo,  um processo de acumulação de experiência. Ela só se transforma num problema quando passa a ser a única referência com a qual contamos numa nova situação.

“A vida só pode ser compreendida olhando-se para trás, mas deve ser vivida olhando-se para a frente.”

Niels Bohr, 1885-1962, físico dinamarquês

Quando se trata da gestão de negócios, então, confiar exclusivamente na experiência pode ser desastroso. Aliás, com base na idéia de que, nos turbulentos dias atuais, “não há pior conselheiro do que o sucesso do passado”, Gary Hamel & C.K. Prahalad, escreveram o seu famoso livro “Competindo Pelo Futuro” (Editora Campus, Rio de Janeiro), onde afirmam com todas as letras que a empresa que quiser chegar no futuro entre as primeiras deve, pelo menos em parte, esquecer sua experiência passada.
Já virou praticamente lugar comum a idéia de que a experiência funciona como faróis colocados na traseira de um veículo, iluminando o passado. (Com base  nessa imagem, inclusive, o ex-ministro e embaixador brasileiro Roberto Campos usou da ironia para intitular sua volumosa autobiografia: “Lanterna de Popa”).

“A experiência é uma repetição e não uma sabedoria.â€?

Edmund Burke, 1729-1797, filósofo irlandês

Justamente por ser uma repetição mas, ao mesmo tempo, iludir, fazendo-se passar por sabedoria, a experiência oferece o seu maior risco: nos deixa acomodados, quando não auto-suficientes, e propensos ao erro diante de novos desafios.
Em se tratando de uma situação sem maior risco, tudo bem. O erro não tem muita importância, pode ser corrigido sem maiores custos. Caso contrário, os custos podem ser altos.
Vejamos um exemplo aparentemente banal: dirigir. Saímos todos os dias, percorremos os mesmos caminhos pilotando o mesmo veículo e não acontece nada. A cada dia que passa, acumulamos mais experiência na direção, sabemos dirigir cada vez melhor, ficamos mais ousados, mesmo. Até que, de repente, “não mais que de repente” como disse o poeta, nos envolvemos num acidente, felizmente sem danos maiores. Motivo verdadeiro: desatenção misturada com imprudência.
Na vida profissional é parecido. Quando menos esperamos, somos surpreendidos por um acidente. Motivo verdadeiro: pensávamos que já sabíamos como lidar com aquela situação e negligenciamos sua preparação.

“Quem não leva a sério a preparação de algo está se preparando fatalmente para fracassar.â€?

Benjamin Franklin, 1706-1790, político e inventor norte-americano

Uma coisa muito ruim que se faz, tanto na vida pessoal quanto profissional, é confiar demais na experiência para lidar com situações novas. O susto pode ser grande e o prejuízo também, sobretudo porque não provisionado.