Baixíssima capacidade de lidar com acrise compromete futuro do governo Lula


A semana que passou foi particularmente difícil para a esquerda brasileira. Na quinta, 11.08, a todos chamou atenção o choro coletivo dos deputados do PT no plenário da Câmara, depois de saberem, pela voz de Duda Mendonça na CPI dos Correios, que o partido lhe havia feito pagamentos pelo caixa 2 do valerioduto em paraísos fiscais no exterior. Na sexta, 12.08, o presidente Lula fez um discurso ao país em que, embora aquém do que seria necessário, dada a gravidade da crise, confessa a existência do mar de lama que ameaça invadir seu gabinete. E no sábado, 13.08, falece aos 88 anos no Recife, o deputado Miguel Arraes de Alencar, presidente do PSB e ícone da esquerda no país, o último dos políticos de peso pré-64 ainda em atividade. O “último tamoyo”, como a ele se referiu o repórter Jorge Bastos Moreno, de O Globo, em seu blog (oglobo.globo.com/online/blogs/ moreno/default.asp).
“Arraes, Ulysses, Tancredo e Brizola foram de uma geração que deixa marca na história deste país. Lula conviveu com os quatro. Cada um a seu jeito, no fundo tinham alguns pontos em comum, os mais importantes deles: espírito público e amor à liberdade.”
Jorge Bastos Moreno, Blog do Moreno, 14.08.05
Apesar da convivência com esses e com vários outros políticos experimentados ao longo de sua vitoriosa trajetória política, o desempenho do presidente Lula diante da portentosa crise que se abateu sobre o seu governo, aponta para uma grande dificuldade de lidar com a situação. A cada dia que passa, com a evolução gradual e firme da crise, pelo aparecimento de denúncias ou pelo avanço das investigações, vai ficando mais evidente a incapacidade do presidente de lidar com ela. O discurso da semana passada foi uma demonstração marcante dessa dificuldade.
“O pobre discurso do presidente da República acaba sendo apenas a confirmação do que já se vinha notando desde o início da crise: Luiz Inácio Lula da Silva é inepto como piloto de tormenta.”
Clóvis Rossi, Folha de S. Paulo, 13.08.05
A evidência mais clara disso é, justamente, a forma como a crise tem se desenrolado sem que o governo consiga ficar, sequer por alguns míseros dias, à frente dos fatos, sendo surpreendido por novas revelações a cada semana e, não raro, a cada dia.
“O governo tem sido empurrado pelos fatos, entre claudicante e abúlico, esboçando reações tardias, contraditórias e insuficientes.”
Miriam Leitão, O Globo, 14.08.05
Essa inaptidão pessoal para a administração de crises é particularmente agravada pela falta de estrategistas políticos de peso junto ao presidente. O chamado “gabinete da crise” montado para isso é composto pelos ministros da Justiça (Márcio Thomaz Bastos), da Fazenda (Antonio Palocci), da Casa Civil (Dilma Roussef) e da Articulação Política (Jacques Wagner), todos competentes mas fracos e divididos enquanto estrategistas políticos. Como resultado dessa inabilidade acumulada tem-se um quadro que começa a colocar em xeque a capacidade do presidente de permanecer à frente do governo até o fim.
“Pode até permanecer na Presidência da República até o final do mandato, mas ficará como o que os norte-americanos adoram chamar de ‘lame duck’ (literalmente, pato manco; no jargão político, um dirigente abalado, portanto manco).”
Clóvis Rossi, Folha de S. Paulo, 13.08.05
Para evitar esse ou um final até mais triste, o tempo é muito curto mas ainda existe. Para isso, porém, o presidente precisa ir mais além do que já conseguiu ir até agora. Vamos ver.