A juventude brasileira pode dar ao país muito mais do que o hexa no futebol


Na semana passada, dois assuntos dominaram o noticiário no país: (1) a invasão da Câmara dos Deputados pelo MLST; e (2) a abertura da Copa do Mundo na Alemanha. Não parece, mas é possível fazer um paralelo entre eles. Para começar, é fundamental destacar a importância do parlamento num regime democrático.

“…o parlamento é a maior instituição política já descoberta pelo homem na busca do autogoverno.”

José Sarney, Folha de S. Paulo 09.06.06

Apesar disso, o que se ouve em muitas conversas particulares é que os depredadores fizeram bem porque chamaram a atenção dos deputados para o que as pessoas, pelo país afora, pensam deles.

“Em vez de bater no padre, tentaram destruir a igreja.”

José Sarney, Folha de S. Paulo, 09.06.06

Dentre os invasores, uma foi filmada destruindo um terminal eletrônico com impressionante selvageria. Chamava-se Francielli Denizia Asêncio, 21 anos de falta de alternativas e escolhas equivocadas. Foi presa, junto com seus companheiros de baderna.

“…Francielli, ao baixar-se para depredar um dos terminais, deixou entrever uma tatuagem nas costas, na altura da cintura. Depois, ao virar-se de frente, revelou um piercing na sobrancelha. Ela nasceu pobre, mas aspira ao estilo das meninas de lares mais bem aquinhoados.”

Roberto Pompeu de Toledo, Veja, 14.06.06

Esse é o drama de uma juventude sem alternativas porque sem estudo e sem trabalho. Uma juventude que engrossa as fileiras do movimento dos sem terra e, no limite, dos contingentes da contravenção e do crime, dos PCC da vida. Um incalculável desperdício social. Em época de Copa do Mundo, vale o extenso e lúcido comentário de Cristovam Buarque:

“Se todo menino terminasse o ensino médio e a qualidade da escola pública mudasse, a gente ia multiplicar por seis o número de candidatos ao vestibular. Seria exatamente o que acontece com a seleção brasileira de futebol. Ela é boa porque todo menino joga bola quando é pequeno. A gente tem geniais craques vindos dos pobres. Na ciência, no Brasil, nem todos têm a mesma oportunidade. Tem menino que nunca viu um computador e que deixou a educação antes de aprender Matemática. Entre eles poderiam estar alguns Ronaldos, podiam estar alguns Ronaldinhos da Ciência. Os nossos Ronaldinhos da Ciência são impedidos de ‘jogar’ por falta de livros, de computador, de bons professores e de atrativos. (…) Tenho certeza de que já tivemos uns três ou quatro Prêmios Nobel de Literatura no Brasil. Só que eles morreram antes de aprender a ler.”

Cristovam Buarque, IstoÉ, 31.05.06

Na falta de políticas conseqüentes de educação e trabalho, a juventude sem oportunidades e esperança vai invadir terras, o Congresso ou fazer coisas piores. Que país está sendo plantado hoje? Tomara que a Copa do Mundo ajude a reforçar o alerta de Cristovam. O país merece a vitória e a sociedade dias melhores para uma juventude que, se decentemente tratada, pode dar ao Brasil muito mais do que o hexa no futebol.