A semana em que a economia mundial balançou perigosamente à beira do abismo

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Dizem os teóricos e os que acumulam experiência prática que as crises são próprias do regime capitalista. A história econômica mostra essa característica à exaustão. Na semana que passou tivemos o “privilégio” de verificar isso em escala mundial e numa dimensão que impressionou até os mais experientes, como foi o caso do empresário Nathan Blanche, sócio da Tendências Consultoria e espectador privilegiado de todas as crises econômicas desde a década de 1970.

“Nesses volumes, essa crise é inédita.”

Nathan Blanche, Folha de S. Paulo, 19.09.08

De fato, as dimensões e os volumes envolvidos são desconcertantes. Depois do estouro da bolha das chamadas hipotecas subprime, em agosto de 2007, a economia norte-americana vinha emitindo sinais preocupantes de que alguma coisa não andava bem com o seu sistema financeiro. Primeiro o balanço dos bancos começaram a apresentar prejuízos, depois vieram as vendas de ativos, até que em 7 de setembro, as duas gigantes do setor de hipotecas, Fannie Mae e Freddie Mac, foram encampadas pelo Tesouro dos EUA a um custo estimado de US$ 200 bilhões. Os analistas ainda estavam digerindo a incorporação quando a semana passada abriu com a notícia de que o Lehman Brothers, um dos cinco maiores bancos de investimento norte-americanos com ativos de US$ 600 bilhões, sem apoio do governo, protagonizava a maior concordata da história dos EUA. No dia seguinte, o Tesouro novamente volta à carga salvando a maior seguradora do mundo, a AIG, com a compra de 80% dos seus ativos ao preço de US$ 85 bilhões. O mercado foi à loucura, com as bolsas de valores ao redor do mundo, inclusive a brasileira, experimentando as maiores quedas das últimas décadas.

“Nessa situação caótica, houve uma decisão fatídica: a de permitir a quebra do Lehman Brothers. (…) a intenção oficial era emitir um sinal de disciplina para os mercados e deixar claro que havia limites para o uso do dinheiro público no socorro às instituições financeiras (…) foi uma temeridade. A intenção das autoridades americanas acabou completamente soterrada pela violenta reação dos mercados. (…) Tiveram que voltar atrás em menos de 48 horas e assumir o controle da AIG.”

Paulo Nogueira Batista Jr., O Globo, 20.09.08

Com esse movimento hesitante, disseminou-se a impressão de que as autoridades não estavam sabendo o que faziam. Mesmo depois da intervenção na AIG, e dos bancos centrais despejarem no mercado centenas de bilhões de dólares para garantir a liquidez do sistema financeiro, a tempestade continuou com uma força impressionante. Só a bolsa da Rússia teve o seu pregão interrompido por dois dias consecutivos devido a quedas recordes. O crédito entre instituições financeiras simplesmente paralisou e houve uma debandada recorde de recursos para os títulos do Tesouro dos EUA (em tese, o refúgio financeiro mais seguro e, por isso mesmo, o menos rentável do mundo) que passou a dar rendimento real negativo. O movimento alucinado só estancou quando, no final da semana, o governo norte-americano veio a público informar que iria criar uma agência para retirar os títulos podres do mercado a um custo estimado de US$ 700 bilhões. Aí, a gangorra do desespero virou e na sexta-feira as bolsas bateram novos recordes positivos ao redor do mundo. A da Rússia teve que novamente interromper o seu pregão porque, dessa vez, se valorizou demais… O que vai acontecer, só os próximos dias dirão, mas uma coisa parece certa: pelo menos por um bom tempo a farra das finanças globais sem regulação acabou.

“O que se tirou foi o pânico mas a má situação continua. O dinheiro vai ficar mais caro e mais escasso.”

José Roberto Mendonça de Barros, CBN, 22.09.08