Reflexos da crise externa no Brasil:está na hora de colocar as barbas de molho

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Enquanto o pacote de socorro de US$ 700 bilhões proposto pelo Tesouro para salvar o mercado financeiro norte-americano embola-se na lógica da eleição presidencial dos EUA, todos continuam espantados com as dimensões da crise, como verbaliza o vice-diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI).

“…uma tempestade financeira de proporções históricas. As últimas semanas incluíram momentos e acontecimentos quase inimagináveis no setor financeiro. Diante de nossos olhos, placas tectônicas financeiras se moveram, apagando uma forma institucional — o banco de investimento grande e independente.”

John Lipsky, vice-diretor-gerente do FMI

De fato, os cinco grandes bancos de investimentos dos EUA, verdadeiros ícones de Wall Street, instituições centenárias que sobreviveram à crise de 1929, desapareceram. Em março, o insolvente Bear Stearms, com ajuda do Federal Reserve (Fed, o Banco Central dos EUA), foi adquirido pelo JPMorgan. No fatídico dia 14 de setembro, o Lehman Brothers pediu concordata e o Merrill Lynch foi vendido às pressas para o Bank of America. Na semana passada, o Morgan Stanley e o Goldman Sachs se transformaram em bancos comerciais para escapar da corrida aos seus ativos e se habilitarem às linhas de socorro do Fed. Todo esse impressionante movimento já levou até à previsão do “fim” de Wall Street.

“Tornou-se quase lugar-comum dizer que a crise matou Wall Street, a ruazinha que abriga a Bolsa de Nova York e, por isso, se tornou sinônimo de mercados financeiros. No mínimo morreu a Wall Street tal como conhecida nos últimos 75 anos, desde que, em 1933, os bancos comerciais foram separados das empresas financeiras.”

Clóvis Rossi, Folha de S. Paulo, 27.09.08

Além dos bancos de investimentos, outros importantes, ligados ao setor de hipotecas, estão sendo tragados pela crise tanto nos EUA quanto na Europa. No Brasil, as autoridades do governo, inclusive o próprio presidente Lula, depois de um primeiro momento tentando passar a imagem de que o país estava “blindado”, começam a mudar de discurso.

“O impacto da crise é muito forte e não há país que fique isento de algum problema.”

Guido Mantega, ministro da Fazenda, 26.09.08

É verdade que, diferentemente das crises anteriores, o Brasil se encontra em muito melhores condições macroeconômicas, como destaca o conceituado economista Luciano Coutinho.

“Temos US$ 200 bilhões de reservas internacionais, aumentamos o superávit primário, o país já é grau de investimento e apresenta uma velocidade importante de expansão para os investimentos, quase duas vezes e meia superior ao ritmo do crescimento.”

Luciano Coutinho, presidente do BNDES, 27.09.08

Todavia, apesar desta muito melhor situação, a prudência manda seguir o preceito popular de “colocar as barbas de molho quando se vê as do vizinho arder”. E está ardendo muito. Os analistas já começam a dar por certo que haverá queda do crescimento em 2009. Dos projetados mais de 5%, já se dá como lucro se o crescimento for de 3% do PIB. Vamos continuar acompanhando os acontecimentos.