O "fim do mundo" de cada dia

Em 1937 Assis Valente, um dos mais criativos compositores populares da música brasileira compôs um notável samba chamado “E O Mundo Não Se Acabou“. Gravada no ano seguinte com sucesso imediato por Cármen Miranda e regravada em 1998 por Paula Toller em interpretação tão boa quanto irreverente, a música é uma bem-humoradíssima sátira sobre o fim do mundo por eclipses e colisões de cometas com a terra.
Essa música mostra o quanto não é nova essa celeuma de fim do mundo. Trata-se, por certo, de um temor que acompanha a história da humanidade sobre a terra. Afinal, aprendemos a duras penas com a vida que tudo que tem começo tem fim, por mais (usando a expressão do poeta Manuel Bandeira) “impregnado de eternidade” que aparente estar. Esse temor, que podemos chamar de “natural”, de tempos em tempos manifesta-se em larga escala e não respeita nem mesmo a cientificidade de nossa época, como vimos na semana que passou pelo destaque, ainda que num tom predominantemente sarcástico, dado pela mídia às profecias de Nostradamus sobre o último eclipse solar do século.
Todavia, misticismos e ironias à parte, é preciso não esquecer que, em se tratando do assunto, não tem muito sentido esperar por uma data fatal.

“Não espere pelo Juízo Final; ele acontece todo dia.”

Albert Camus, escritor francês, segundo Jerry R. Wilson em “Marketing Boca a Boca”, Editora AS, Rio de Janeiro, 1993

Quem tem responsabilidade pela gestão de uma empresa, independente do tamanho que ela tenha, sabe mais do que Camus, como isso é verdadeiro. Às vezes o “fim” se dá, até mesmo, mais de uma vez no mesmo dia.
O importante é estar preparado para promover tantos recomeços quanto forem necessários, não se deixar aniquilar pelos inevitáveis revezes, não ficar refém do medo.
Talvez esse seja o segredo das empresas que têm a coragem de prosseguir e ultrapassam os obstáculos de cada “juízo final”: conseguem, apesar das superstições, dos temores, dos revezes mais difíceis, resistir ao medo.

“Coragem é resistência ao medo, domínio do medo, e não ausência do medo.”

Mark Twain], escritor norte-americano, 1835-1910, “Pequeno Manual de Qualidade de Vida”, José Ronaldo Peyroton, Editora United Press, Campinas, 1999

Resistir ao medo, mesmo reconhecendo o seu poder, é uma exigência para evitar a paralisia e ir além.

“O medo aumenta o perigo e diminui os homens.”

Alberto Cunha Melo, poeta pernambucano, pintado no muro do Museu do Estado de Pernambuco