Vez por outra nos deparamos com situações cotidianas onde ficamos receosos, com medo mesmo, de tomar uma decisão por conta de suas possíveis conseqüências. O normal é nos recriminarmos intimamente por isso. Afinal, somos incitados, desde a mais tenra infância, a ser corajosos. A não temer as conseqüências das nossas decisões.
É atribuída ao presidente Juscelino Kubitschek uma frase bem característica dessa ideologia dominante:
“Deus poupou-me o sentimento do medo.”
Juscelino Kubitschek de Oliveira, 1902-1976
Essa frase de Juscelino, tem servido até para inspirar plágios de qualidade bastante duvidosa como o cometido pelo inacreditável político paulista Paulo Maluf:
“Medo foi uma palavra que papai do céu não escreveu no meu dicionário.”
Paulo Salim Maluf, candidato a prefeito de São Paulo
Independente da admiração que o ex-presidente merece, é razoável supor que sua frase contenha uma ampla dose de retórica, bem comum entre os políticos, mesmo entre aqueles de boa estirpe como ele. Por essa razão, não deixa de causar surpresa a resposta de um bem sucedido empresário à pergunta sobre qual o segredo do seu sucesso empresarial:
“Medo. Muito medo de fazer as coisas.”
Esse medo, corajosamente declarado, por certo; foi responsável pela cautela que inspirou a correção das decisões empresariais tomadas.
Isso porque, muito ao contrário da crença dominante, como já referido no GH 235, ter corarem não significa não ter medo.
“Coragem é resistência ao medo, domínio do medo e, não, ausência do medo.”
Mark Twain, 1835-1910, escritor norte-americano
Ausência do medo, por mais que se diga o contrário, é incapacidade de ver o perigo que pode, facilmente, levar à imprudência. Em última análise, é um tipo especial de loucura.
A pessoa privada de suas faculdades mentais normais pode manifestar a ausência de medo como uma forma de patologia grave. Não sabe distinguir o perigo nas situações cotidianas e pode colocar, por qualquer besteira, a sua vida em perigo.
Essa patologia quando ocorrida no ambiente empresarial pode, facilmente, levar o risco de sobrevivência ao extremo. Há um dito quase popular que expressa bem esse risco: “dinheiro não aceita desaforo”. Nem loucura, poder-se-ia completar.
Diante disto, não é exagero falar-se numa espécie de “função estruturante” do medo.
“A virtude de toda grande e duradoura sociedade consiste não só na bondade e boa vontade mútua entre os homens, mas também no medo recíproco que eles têm uns dos outros.”
Thomas Hobbes, 1588-1679, filósofo inglês
Claro que, embora natural e “estruturante”, o medo não pode nem deve ser paralisante nem servir de pretexto para não se fazer o que precisa ser feito.
Mais do que ficar paralisado pelo medo, é fundamental, tanto do ponto de vista pessoal quanto empresarial, dominá-lo e evitar ficar refém dele.
“Dominar o medo é o início da sabedoria.”
Bertrand Russel, 1872-1970, filósofo inglês