A semana passada foi pródiga em fatos relevantes para o país, tanto do ponto de vista político, quanto econômico, quanto social. Foram quatro quedas recordes: a primeira, do deputado José Dirceu que teve o mandato cassado pela Câmara; a segunda, do PIB no terceiro trimestre/2005; a terceira do Risco Brasil no mercado internacional; e a quarta, mas não menos importante, da pobreza no país.
A cassação de José Dirceu na quarta-feira 31, por 239 votos contra 192, tem uma representação simbólica muito importante. Ex-líder estudantil nos idos de 1968, ex-preso político, ex-exilado em Cuba, ex-clandestino na luta contra o regime militar, ex-presidente do PT, ex-articulador-mor do governo petista, ex-ministro todo poderoso da Casa Civil, o ex-deputado transformou-se num emblema político. Com ele foi “cassada” uma parte fundamental do esquema de poder que assumiu os destinos do país em 2003 e, o que é pior, sem nenhuma garantia de arrefecimento da colossal crise política que se abateu sobre o governo Lula desde que o ex-deputado Roberto Jefferson denunciou o “mensalão”.
“Mas e a crise – arrefecerá? Muitos apostam que sim, mas há argumentos fortes para acreditar no contrário. O cadáver premiado será jogado na cara do presidente até outubro de 2006; a cassação do ‘chefe do mensalão’, além disso, praticamente define o destino dos demais mensaleiros. E, mais importante: eliminada a rainha, o rei fica só e mais exposto no tabuleiro. Dirceu se foi; a crise fica.”
Fernando de Barros e Silva, FSP, 02.12.05
Como se não bastasse esse sério revés político, o governo ainda amargou um outro, também grave: o IBGE divulgou que entre os meses de julho e setembro (terceiro trimestre), a economia brasileira encolheu 1,2% em relação ao trimestre anterior, sinalizando que, com esse resultado, o país não deve crescer mais que 2,5% em 2005, o pior desempenho entre todos os países emergentes (que crescem a taxas superiores a 5%).
“Isso quebra a perna do governo.”
Presidente Lula, segundo a revista Istoé, 07.12.05
Quebra porque, embora esses números ainda devam ser revistos pelo IBGE, se a tendência se confirmar, manda para o espaço o discurso do “espetáculo do crescimento” que estava sendo re-ensaiado para 2006 como a única alternativa para aumentar as chances re-eleitorais do presidente Lula, depois da crise política e da perda dos votos de opinião que garantiram a sua eleição em 2003. Sem crescimento expressivo em 2006, o governo Lula não se diferenciará do de FHC, confirmando a tese de que a economia brasileira continua presa à síndrome do “vôo da galinha” (ver a propósito GH/492).
A constatação da queda do PIB foi tão traumatizante para o governo que a notícia, vinda do exterior, de outra queda, essa benigna, passou quase sem ser percebida: o risco-país caiu a 328 pontos, seu nível mais baixo desde 1994. Do mesmo modo, outra queda importante quase não foi vista: um estudo da FGV apontou a diminuição da pobreza (passou de 35% em 1992 para 25% em 2004 a parcela da população abaixo da linha de pobreza) e da desigualdade (os 50% mais pobres aumentaram sua participação na renda de 12% em 1993 para 14% em 2004 e os 10% mais ricos diminuíram de 48% para 44%).
“O fato é inédito na história brasileira dos últimos 30 anos. Essa queda aconteceu (…) perpassando diferentes governos.”
Marcelo Neri, coordenador do estudo “Miséria em Queda”
Uma prova de que, apesar das crises políticas recorrentes e do crescimento insuficiente e irregular, pelo menos do ponto de vista social, a galinha brasileira aprendeu a voar. Baixo, mas voa.