As mais recentes turbulências na economia internacional (ver número 589) alertam para uma mudança de humor dos mercados que materializa, na prática, uma modificação do clima de céu sem nuvens, com crescimento vigoroso, há pelo menos quatro anos.
“Acabou o céu de brigadeiro. As nuvens voltaram, só não sabemos dizer se elas estão carregadas.”
Oswaldo Assis, Banco Pactual, Exame, 07.06.06
Esse retorno de céu nublado deve-se, principalmente, a desconfianças sobre a capacidade dos Estados Unidos darem conta de um desequilíbrio nas suas contas externas que já atinge a proporção mais do que preocupante de 6,4% do PIB. Até 1990 esse déficit era considerado insignificante (menos de US$ 50 bilhões). Todavia, vem crescendo ano após ano e em 2005 chegou ao impressionante patamar de US$ 800 bilhões (mais de US$ 2 bilhões por dia). Isso significa que, todo ano, os EUA têm que captar o equivalente a um PIB brasileiro para fechar suas contas externas (emitir títulos, atrair capital, etc).
“Países com tamanho desequilíbrio geralmente passam por um ajuste que combina desvalorização da moeda com forte recessão. Os Estados Unidos vão escapar, mais uma vez, de um ajuste doloroso? Ninguém sabe. O que se sabe é que uma recessão forte por aqui acaba afetando o mundo todo.”
José Alexandre Scheinkman, Exame, 07.06.06
Esse alerta do economista brasileiro Scheinkman, professor da universidade de Princeton, aponta para a evidência de que, no dia em que os EUA não conseguirem mais financiar esse déficit, o dólar vai se desvalorizar pelas forças de procura e oferta para ajustar as contas (dólar valendo menos significa menos poder de compra dos norte-americanos e, portanto, menos importação e menos déficit comercial). A queda que aconteceu nos mercados mundiais está dentro do contexto do déficit norte-americano e é uma pequena amostra do que pode acontecer ao redor do mundo se os piores cenários se confirmarem.
Os mercados reagiram a uma possível elevação dos juros dos EUA para, justamente, conter o consumo interno e atrair capital externo (no fundo, para financiar o déficit). Mais juro significa menor crescimento. No limite, recessão. Dólar desvalorizado e/ou juros altos é que estão na base da antecipação dos mercados financeiros que, em última análise, significaria o fim do ciclo de alto crescimento econômico mundial.
“Ainda é cedo para saber se a festa acabou — talvez ela ainda dure alguns meses ou anos, afinal o ente chamado mercado costuma ter comportamento bipolar, oscilando entre a euforia e a depressão —, mas o fato é que essa perspectiva deixou de fazer parte de um cenário improvável e longínquo.”
Revista Exame, 07.06.06
E o Brasil? Como fica num cenário de redução do crescimento mundial? Sofreria tanto quanto nas crises anteriores?
“O Brasil está mais forte: as contas externas estão sólidas, há certo ajuste fiscal. O nosso problema é a incapacidade de crescer. Mesmo diante de um cenário tão espetacular, não conseguimos crescer para valer.”
Eduardo Gianetti da Fonseca, Exame, 07.06.06
Se se confirmarem as previsões mais pessimistas e a economia mundial der uma freada, o Brasil terá perdido a melhor oportunidade de crescimento vigoroso dos últimos 25 anos. Esperemos que ainda haja tempo para reagir.