Com a palavra Alan Greenspan:mea culpa do ex-xerife do Federal Reserve

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Xerife absoluto da política macroeconômica norte-america durante quase duas décadas, período em que ocupou a poderosa presidência do Federal Reserve (Fed), o Banco Central dos EUA, Alan Greenspan, apelidado pela mídia de Sr. Mercado, hoje é acusado de ter sido o pai da bolha imobiliária cujo estouro precipitou o sistema financeiro internacional naquela que já é considerada a pior crise desde a Grande Depressão de 1929. Depondo no Congresso norte-americano, semana passada, Greenspan alertou para as dimensões do problema.

“O mercado de crédito vive um tsunami que só se vê uma vez em cada século.”

Alan Greenspan, ex-presidente do Fed

Inquirido pelos deputados sobre sua política de juros baixos, em determinados momentos até negativos, que estimulou os investidores a correrem para o mercado de imóveis e sobre a falta de controle dos derivativos financeiros que inflaram a liquidez a um nível jamais visto, Greenspan declarou o seu espanto.

“Fiquei chocado porque entendi por cerca de quarenta e poucos anos, com muitas evidências, que o mercado estava trabalhando excepcionalmente bem.”

Alan Greenspan

Expoente do neoliberalismo econômico que teve como figuras políticas de proa o ex-presidente dos EUA Ronald Reagan e a primeira-ministra inglesa Margareth Thatcher, Greenspan advogava a liberdade plena das instituições financeiras na pressuposição de que elas próprias seriam as mais preocupadas em preservar o interesse dos seus clientes e acionistas. Mas o que se verificou, depois do estouro da bolha imobiliária, foi a incrível falta de responsabilidade destas instituições, muitas delas centenárias.

“Cometi um erro na presunção de que o auto-interesse de organizações, especificamente bancos e outros, seria capaz de proteger melhor seus próprios interesses e de seus acionistas.”

Alan Greenspan

Durante o período Greenspan e na plena vigência do que viria a ser chamado de “fundamentalismo de mercado” que se seguiu à queda do Muro de Berlim, o setor financeiro nos EUA saltou de 10% do total dos lucros corporativos em 1980 para 40% em 2006, apesar de ser responsável apenas por 5% dos empregos formais. Isso, mesmo enfrentando pelo caminho o estouro da bolha da Nasdaq que, em 2000, perdeu ¾ do seu valor (US$ 5 trilhões). A crise atual vai mudar esse quadro e já provocou a escrita de um epílogo de Greenspan para a sua biografia “A Era da Turbulência” onde manifesta, a seu modo, a convicção das mudanças que virão pela frente.

“Nos próximos anos, quase certamente nos veremos em um mundo econômico diferente daquele a que nos acostumamos.”

Alan Greenspan

Nessa espécie de mea culpa recente, o economista de 82 anos, embora avesso a projeções enfáticas sobre o futuro, tem insistido sobre a magnitude do problema, assim como insistiu durante muitos anos sobre a “exuberância irracional” vivida pelo mercado no caso das ações das empresas pontocom. Sobre a duração da crise, suas expectativas não são boas.

“Levará meses, talvez anos, para que se saiba se essas depreciações de ativos representam com exatidão os prejuízos reais dos bancos. Apenas essa incerteza implica que o ponto final para essa crise está muito distante.”

Alan Greenspan